O exame de ordem que reprovou o examinador

Passei cinco anos na universidade e depois mais de um mês dedicado exclusivamente à prova da segunda fase do XII Exame de Ordem Unificado da Ordem dos Advogados do Brasil.

Não tive férias nem tranquilidade durante as festas de final de ano e os últimos dias que antecederam o certame, realizado no dia 09 de fevereiro, foram tensos. Tive insônia, pressão baixa, entre outros sintomas típicos nesse tipo de ocasião.

Contudo, com a certeza de que havia me preparado o suficiente para fazer uma boa avaliação, entrei na sala do exame com a tranquilidade necessária, e assim permaneci mesmo após o fiscal dizer que haveria uma errata no enunciado da peça de Direito Administrativo, área que eu havia escolhido.

De fato, fiquei surpreso ao saber que o examinador havia errado metade da prova, mas nunca imaginei que as provas começariam sem a correção desse erro. Ledo engano.

No horário marcado, as provas foram distribuídas e, quando todo mundo estava com a sua, o fiscal anunciou: Podem começar. Quem for fazer Direito Administrativo comece pelas questões, pois a errata ainda não chegou.

Fiquei sem acreditar, pois no meu planejamento – e no de quase todos os candidatos – dever-se-ia começar pela peça, para não correr o risco de deixá-la incompleta.

Como não havia escolha, comecei a ler as questões e fui percebendo que sabia a maioria das respostas, porém a minha cabeça estava na peça. Eu queria fazer a peça. Eu precisava fazer logo a peça. E o nervosismo começou a tomar conta de mim.

Eis que chega a fiscal com duas erratas escritas em 1 folha de papel A4. Isso mesmo, 1 folha. Não tinha erratas para todo mundo. Cada candidato deveria, sucessivamente, transcrever a errata no respectivo caderno de provas. E a ansiedade só aumentou.

Fiz a transcrição na maior pressa do mundo e comecei a escrever minha peça processual, até que, depois de mais de uma hora de prova, uma pessoa da Coordenação do Exame de Ordem Unificado em Natal entrou em sala dizendo que iria escrever no quadro uma terceira errata.

A essa altura, eu só pensava uma coisa: Por que isso está acontecendo justo na primeira vez em que me submeto a essa prova?

Enfim, redigi a peça, acertei o cabimento e a estrutura, porém, como era de se esperar, o tempo e a calma perdidos no começo da avaliação fizeram falta na hora de responder as questões.

Apesar tudo, ainda espero receber uma boa pontuação e ser aprovado, entretanto muitos outros bacharéis em Direito foram ainda mais prejudicados, não tiveram acesso a todas as erratas, ou só foram cientificados verbalmente do seu conteúdo, ou ficaram ainda mais nervosos e erraram a peça cabível. Sem falar naqueles que se recusaram a fazer a prova depois de tanta lambança, de tanta desorganização.

É nesses, também, que estou pensando agora. Será justa uma possível reprovação deles?

Na última sexta-feira (14), a Fundação Getúlio Vargas, “organizadora” do certame, e a Coordenação Nacional do Exame de Ordem Unificado, no intuito de amenizar o transtorno que causaram, divulgaram comunicado dizendo que “aceitarão mais de um tipo de peça processual como resposta ao problema proposto, sendo eles Recurso Ordinário Constitucional e Apelação”.

Antes disso, a FGV já havia informado que “a banca avaliadora levará em consideração quaisquer dificuldades porventura encontradas pelos examinandos de Direito Administrativo em virtude da divulgação da errata durante a realização do exame”.

Ocorre que não é isso o que queremos. Queremos, sim, a anulação da prova de Direito Administrativo e a atribuição integral dos pontos aos candidatos. Do contrário, a Ordem dos Advogados do Brasil estará, no mínimo, homenageando a inobservância aos princípios da isonomia e da vinculação ao edital na sala da injustiça.

Ressalte-se: na segunda fase do XII Exame de Ordem Unificado, área Direito Administrativo, quem cometeu o erro mais grave foi o examinador. Quem não soube fazer o endereçamento de um Mandado de Segurança Coletivo em face de ato de Governador de Estado foi o examinador. Por outro giro, foram a Fundação Getúlio Vargas e a Coordenação Nacional do Exame que erraram na organização. Foram elas que não souberam sequer divulgar uma errata.

Se alguém tem que ser reprovado, portanto, que não seja nenhum dos bacharéis em Direito que fizeram essa prova indiscutivelmente nula. Esses, na sua maioria, certamente estudaram bastante, dedicaram suas vidas ao exame, investiram financeiramente o que não podiam e não podem ser prejudicados por quem não teve o mesmo zelo nessa preparação.

Artigo publicado n’O Jornal de Hoje, edição dos dias 15 e 16 de fevereiro de 2014.

Fonte: O Jornal de Hoje

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